terça-feira, 8 de novembro de 2016

A LEITURA QUE TRANSFORMA

14:05

A Leitura que Transforma

Autora: Márcia Patrícia Barboza de Souza

RESUMO

Qual a importância do ato de ler? Que efeitos a leitura pode causar à vida de uma pessoa? A leitura deve ser um ato solitário ou compartilhado? Essas e outras questões se fazem presentes quando o assunto envolve a leitura em toda a sua dimensão. Assim, busco através das reflexões trazidas neste trabalho, respostas para tais questionamentos e também mostrar um breve panorama de difusão da leitura nos dias atuais, como vem sendo seu trabalho em sala de aula e a importância das rodas de leitura no processo de interação autor/leitor/texto e na construção de sentidos. O estudo apóia-se em autores como Freire (1988), Bakhtin (1992), Zilberman (2007) e Larrosa (2004).



“Vamos fazer do Brasil um país de leitores”

O slogan fez parte de uma campanha de difusão da leitura no ano de 2002; foi divulgado em escolas através de cartazes (inclusive um deles transformado em quadro e colocado na biblioteca de minha escola). A crítica é: como formar leitores em um país marcado pela carência cultural e pela dificuldade econômica em adquirir livros? Pessimismos à parte, trabalhemos com os fatos. A realidade da leitura no Brasil mostra uma grande deficiência na formação de leitores; atualmente, em nosso país, há um número significativo de analfabetos funcionais – prova disso é o resultado do PISA/2000 e da PROVA BRASIL/2005, que apontaram o nível baixo dos alunos em interpretação textual, ou seja, alunos que leem, mas não conseguem abstrair a mensagem do texto.


É certo que vários fatores colaboram para esse panorama: famílias de não leitores, custo alto dos exemplares, escassez de bibliotecas, acervos desatualizados e o papel da escola, em especial o do professor, no trabalho com a leitura em sala de aula. Este último, aliás, tem sido alvo de críticas de diversos autores, pois para muitos especialistas, a leitura vai mal porque a escola está mal. Em muitas não há o espaço privilegiado para se realizar a leitura: a biblioteca; quando há tal espaço, conta-se com acervos desatualizados e profissionais mal preparados ou inexistentes. Um fato triste deve ser registrado: quando o número de alunos não suporta o número de salas, em uma escola, apela-se para o espaço da biblioteca, transformando-a em sala de aula, excluindo-a do cenário escolar.

Ainda referindo-me à escola, constata-se uma maior preocupação em incentivar a leitura aos alunos da educação infantil e séries iniciais com cantinhos da leitura, hora do conto, etc, o que é muito válido, pois é através dos primeiros contatos que a criança pode se inserir no mundo fantástico da leitura e daí vai, aos poucos, descobrindo outras leituras e se tornando um sujeito leitor. No entanto, verifica-se que todo esse trabalho de inserção ao mundo da leitura prazerosa se esvai do 5º ano em diante, quando os professores começam a adotar como atividades fichamentos de leitura, tornando o ato de ler meramente obrigatório, com histórias muitas vezes desinteressantes para os alunos.

Considerando que, em muitos casos, o livro didático é o único instrumento usado para a leitura e que a escola seja o único espaço de contato com a leitura, esta deve viabilizar um trabalho pedagógico apresentando a diversidade de gêneros discursivos existentes, bem como seus objetivos. Deverá também oferecer condições para que seus alunos despertem para o gosto e o compromisso da leitura, mostrando a eles o caráter desafiador do ato de ler. Assim, despertando-os para uma leitura crítica do escrito.

O papel de mediador desempenhado por nós professores não é tarefa fácil, aliás, esse trabalho não deve ser tarefa exclusiva do professor de Língua Portuguesa, em todas as disciplinas ele deve ser desenvolvido. A função de cada um de nós, professores e professoras, independente da área curricular, é promover a leitura de textos que devam ser aprofundados para que todos vivenciem o encantamento da descoberta de sentidos trazido pela leitura, dialogando com a realidade e formando para a cidadania. Seguindo o pensamento de Paulo Freire (1988), quanto mais um povo se torna consciente de sua história, mais facilmente perceberá as dificuldades socioeconômicas e culturais da realidade em que vivemos e, conseqüentemente, estará apto para o enfrentamento e a libertação.

Segundo Jorge Werthein (2007) – representante da UNESCO no Brasil de julho/1996 a setembro/2005 – é nesse contexto que se encaixa o sentido pedagógico da leitura – o saber ler – ler para garantir a autonomia intelectual, considerando a escola o lócus para a aquisição dessa leitura crítica. Mas, para que isso se estabeleça, é necessário que o professor também seja um leitor.

De acordo com Zilberman (2007), raramente a escola provoca lembranças prazerosas de leitura em seus alunos; com atividades pedagógicas entediantes, a leitura parece ficar “do lado de fora” porque os professores não a incorporam ao universo do ensino.

Novamente o professor, essa figura tão marcada! Mais uma vez a culpa recai sobre ele, mas é importante destacar que algumas condições adversas o impedem de ser um leitor: baixos salários que levam a um trabalho em dois ou até três turnos, com funções concomitantes, não lhes sobrando tempo para ler, e muitas vezes sem dinheiro para adquirir livros. Daí seu trabalho é cercado de fragmentação e improvisação do ensino da leitura na sala de aula. A isso se acrescenta outros fatores que ultrapassam a competência do professor e podem impedir um efetivo trabalho de leitura na escola: grande número de pessoas que nem chegam aos bancos escolares, alto índice de evasão e repetência, além de precária infra-estrutura e pouca ou nenhuma participação da família na formação do aluno-leitor.

Espaços de leitura
É fato considerar a escola o principal lugar disseminador da leitura, bem como o espaço das bibliotecas que, representam um número pequeno em relação aos habitantes (de acordo com dados do Ministério da Educação e Cultura - MEC há 4000 bibliotecas públicas para cada 40.000 habitantes, enquanto a recomendação da UNESCO é que se tenha 1 biblioteca para cada 12.000 habitantes), possui acervos desatualizados e está distante das camadas populares.

Porém, outros lugares já são vistos como espaços de leitura: parques, hospitais, penitenciárias, sindicatos, igrejas, centros comunitários e a nossa própria casa. Há de se considerar também projetos inovadores como o ‘trem-biblioteca’, no sul do país e os ‘bibliobarcos’ na Amazônia e Rio São Francisco.

Programas de incentivo à leitura freqüentemente ‘invadem’ o cenário da escola. São programas que distribuem livros às crianças, como o ‘Literatura em minha casa’(2007), numa tentativa de levar a leitura à casa dos estudantes, numa forma de democratizar o acesso à leitura. Segundo dados da Câmara Brasileira do Livro (2007), o Brasil consome em média cerca de 2,3 livros por pessoa (incluindo os livros didáticos distribuídos pelo MEC), enquanto a média de países desenvolvidos é de 6 a 10 livros anualmente, sendo a maior parte do material adquirido em bancas de jornal. Outros projetos como o ‘Programa Nacional de Biblioteca na Escola’(oferecendo material de apoio a alunos e professores de escolas públicas) e o ‘Pró-leitura na formação do professor’ (ação conjunta entre MEC e França) são exemplos de iniciativas que fomentam a leitura em nosso país. Devem-se registrar também programas com o apoio de instituições como a Petrobrás (Leia Brasil), o Banco do Brasil (Rodas de Leitura) e da Volkswagem (Formação de Mediadores de Leitura).

Programas de formação para mediadores de leitura são de suma importância, já que proporcionam orientação para realização de rodas de leitura e servem para fomentar a cultura e a valorização da leitura na escola e em outros espaços da comunidade. Tais programas são realizados com o objetivo de difundir a leitura a partir da convivência em um ambiente letrado, contando inclusive com o financiamento de empresas, num sistema de parcerias. Atualmente, devido ao avanço da tecnologia, pode-se ver a disponibilização de livros na Internet, alguns com acesso gratuito, outros de acesso restrito, no entanto ambos apresentam mais uma forma de universalizar a leitura.


As Rodas de Leitura

A memória me remete ao tempo de infância, quando lia meus livrinhos (os quais guardo até hoje em uma estante) várias vezes até decorar toda a historinha. Fazia isso por prazer, porque gostava de olhar as figuras e já saber o que estava escrito. Mais adiante me lembro da adolescência, na verdade nem me lembro dos livros que li nessa fase, sei que os lia na escola, junto com outros colegas, em voz alta para todos acompanharem. Depois preenchíamos uma folha com algumas perguntas sobre o livro e só. ‘Só’ no sentido ambíguo da palavra. A leitura pode ser esse equívoco: atividades sem reflexão, somente obrigação em cumprir tarefas ou muitas vezes alguém sozinho, mergulhado nos escritos, concentrado no silêncio do ato de ler. Porém, ela não deve ser vista somente como característica solitária, ao contrário, a companhia de alguém pode ser bem estimulante, pode gerar conflitos de opiniões em uma discussão harmoniosa, sendo uma mesma história percebida através de ângulos diferentes.


Dessa forma os grupos de leitura apresentam características positivas e oportunizam momentos de encontros e reflexão, e fazem com que possamos conhecer melhor o outro, assim como aponta Larrosa (2004) essa é uma das transformações que a leitura pode proporcionar. É interessante destacar que nesse trabalho coletivo e interativo com a leitura podem ser discutidos textos literários, filosóficos, científicos, teológicos, dependendo dos interesses dos grupos. As rodas de leitura trabalham com o ato de ler em sua essência: ler com prazer, ler para entender o escrito, ler para introduzir-se no mundo imaginário e trazê-lo à realidade, numa espécie de descoberta com a verdade. Assim, não se pode negar que a leitura em grupo amplia e ordena nossos conhecimentos.

A literatura nos mostra que as rodas de leitura contribuem de forma significativa na formação de novos leitores, melhoram a participação, o espírito crítico, a atenção e a criatividade do sujeito. O objetivo das rodas de leitura é compreender a essência do escrito num processo dialógico da linguagem, assim como aponta Bakhtin (1992). A leitura implica construção de sentidos, pois não se resume apenas em decodificar a mensagem, mas também absorver os múltiplos sentidos que ela proporciona.

Por isso é imprescindível que o leitor compartilhe dos sentidos do autor e seja capaz de construir os seus próprios. Sentidos estes construídos no momento de interação que acontece entre texto e leitor, daí a importância que este tem em reunir seus conhecimentos sobre os gêneros discursivos para ser capaz de formular sentido nessa interação com o autor.

Nas rodas de leitura é importante considerar a colaboração sem que haja a competição, pois uma vez que o objetivo do grupo seja constituir uma troca, a presença de alguém que queira se tornar o ‘dono da palavra’ pode inibir os demais participantes e assim não permitir a interação. Para que isso não aconteça, o leitor-guia deve ser experiente e promover a igualdade de participação.

As rodas de leitura se caracterizam por seu perfil de ‘compartilhamento’, no qual os participantes se reúnem em torno de um leitor-guia. Além disso, devem oferecer um ambiente favorável ao grupo, com um número médio de frequentadores, apresentando assuntos diversificados ou estudos aprofundados de um mesmo tema; também devem ser considerados o tempo e a intertextualidade, todos critérios que auxiliam na ampliação dos horizontes de leitura pelos não-iniciados.

Reafirmando o pensamento de Yunes (1999, p.21), “ler em círculo não é novo: novo é o uso do círculo para aproximar os leitores na troca de suas interpretações”.


Texto e leitor – interação e identificação

A interação texto/leitor pode provocar no indivíduo uma identificação com seu íntimo, muitas vezes, revelando-se a si mesmo.


A comunicação é essencial na vida do ser humano e especificamente na comunicação escrita a possibilidade do diálogo imediato não se torna possível devido ao tempo em que o texto foi produzido e sua recepção pelo leitor. Daí a necessidade de se construir sentidos por parte desse leitor, estabelecendo uma dinâmica de interação com o texto, de modo a transformar o entendido e transformar-se a si mesmo. Assim como aponta Freire (1988), “a leitura da palavra não é apenas precedida pela leitura do mundo, mas por uma certa forma de ‘escrevê-lo’ ou ‘reescrevê-lo’, quer dizer, de transformá-lo através de nossa prática consciente’.

Lemos em diferentes situações do nosso cotidiano; lemos para colher informações, para adquirir conhecimentos, para desenvolver atividade do dia-a-dia, para escrever, lemos pelo simples fato de ler, lemos... Portanto, a função social que a leitura desempenha alcança uma dimensão que nos faz desenvolver habilidades cognitivas e nos leva ao domínio de diferentes competências. Os próprios Parâmetros Curriculares Nacionais - PCN (1997) propõem que sejam oferecidas práticas de leitura que propiciem a reflexão e levem o leitor à construção desses sentidos.

A leitura não pode ser vista apenas como um processo de decodificação, mas como um processo dialógico marcado pela polissemia trazida pelo texto. Ela representa uma soma. Ler é compartilhar sentimentos, é dividir conhecimentos, é somar-se.


Considerações finais

Historicamente a construção de conhecimentos ficou a cargo das escolas, e a leitura foi sendo substituída por aulas expositivas, resumos de obras, fragmentos de textos, levando o leitor a ler pela imposição e não por prazer.


Entretanto, por tudo o que já foi exposto, é fato constatar que a leitura pode gerar seres humanos conscientes, curiosos e críticos. Também pode se tornar um instrumento de conquista de liberdade para o homem, quando amplia a visão de mundo, gera transformação, compreende o cotidiano, tira da alienação. Ao ser incorporada, a leitura pode promover a construção de conhecimentos, a formação da cidadania, e um novo estilo de vida; seguindo o pensamento de Larrosa (2004) a leitura traz um outro olhar do mundo (talvez para alguns isso cause uma profunda tristeza por reconhecer e indignar-se, sem poder para mudar a realidade).


Vejo nos círculos de leitura ou qualquer outro projeto de difusão da leitura, um espaço, um modo de propiciar ao indivíduo a oportunidade de sair de sua situação de ‘oprimido’ (remetendo a Paulo Freire) e (inter) agir na sociedade na qual está inserido.

Todos esses fatores acabam por contribuir na formação da identidade do leitor. Fazendo uma analogia com o ‘mito da caverna’, a leitura é a luz que dá a compreensão do mundo.



Referências bibliográficas

BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.
Boletim Unesco News. Jorge Werthein deixa UNESCO no Brasil após uma década de sucesso. Brasília, n. 116, 8 set. 2005 (Edição especial). Disponível em:http://www.unesco.org.br/noticias/unesconews/#. Acesso em: 10 ago 2007.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília, 1997.
CÂMARA BRASILEIRA DE LEITURA. Disponível em www.cbl.org.br. Acesso em 10 ago 2007.
DAUSTER, T. Espaços de Sociabilidade: ouvindo escritores e editores sobre a formação do leitor e políticas públicas de leitura no final do séc. XX. Disponível em www.leiabrasil.org.br. Acesso em 10 ago 2007.
DEBUS, E. S. D. Vamos fazer do Brasil um país de leitores: em busca do tempo perdido...e dos livros também!!, Disponível em: www.dobrasdaleitura.com/revisao/ pnbe2002ed.html. Acesso em 12 ago 2007.
FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 22ª ed., São Paulo: Cortez, 1988.
GARCIA, P.B. Oralidade, escrita e memória: experiências com rodas de leitura e “conversas de rua”. Disponível em www.tvebrasil.com.br/SALTO/boletins2006. Acesso em 12 ago 2007.
LARROSA, J. Pedagogia Profana: danças, piruetas e mascaradas. Tradução de Alfredo Veiga-Neto. 4ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2004, p.97-146.
PAÍS DE LEITORES. Revista Cidades do Brasil, 36ª ed., nov/2002. Disponível em: http://cidadesdobrasil.com.br/cgicn/news.cgi?cl=099105100097100101098114&arecod=17&newcod=124. Acesso em 10 ago 2007.
VAMOS FAZER DO BRASIL UM PAÍS DE LEITORES. Disponível em: www.moderna.com.br. Acesso em 12 ago 2007. 
WERTHEIN, J. A UNESCO e a formação do leitor. Disponível em www.leiabrasil.org.br. Acesso em 10 ago 2007.
YUNES, Eliana. Círculos de Leitura – teorizando a prática. In: Leitura: teoria e prática. ano 18, jun/1999, n. 28, Campinas: Mercado Aberto/ABL, p.17-21.
ZILBERMAN, R. Disponível em www.leiabrasil.org.br. Acesso em 10 ago 2007.

Márcia Patrícia Barboza de Souza - Mestranda em Educação na Universidade Católica de Petrópolis; Especialista em Pesquisa e Docência no Ensino Superior e Língua Portuguesa; Professora de Língua Portuguesa da rede municipal de ensino de Juiz de Fora e da rede estadual de Minas Gerais.

A IMPORTÂNCIA DO LÚDICO NA APRENDIZAGEM , COM AUXÍLIO DOS JOGOS

14:01
A importância do lúdico na aprendizagem, com auxílio dos jogos
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A educação para obter um ensino mais eficiente aperfeiçoou novas técnicas didáticas consistindo numa prática inovadora e prazerosa. Dentre essas técnicas temos o lúdico, um recurso didático dinâmico que garante resultados eficazes na educação, apesar de exigir extremo planejamento e cuidado na execução da atividade elaborada. O jogo é a atividade lúdica mais trabalhada pelos professores atualmente, pois ele estimula as várias inteligências, permitindo que o aluno se envolva em tudo que esteja realizando de forma significativa. Através do lúdico o educador pode desenvolver atividades que sejam divertidas e que sobretudo ensine os alunos a discernir valores éticos e morais, formando cidadãos conscientes dos seus deveres e de suas responsabilidades, além de propiciar situações em que haja uma interação maior entre os alunos e o professor numa aula diferente e criativa, sem ser rotineira. 
Palavras Chaves: educação, ensino, lúdico, jogo, dinâmico, educador, valores.

A princípio, a explanação desse trabalho tem como objetivo mostrar a importância de se trabalhar o lúdico na esfera escolar para a obtenção de qualidade no processo educacional. E para que essa aprendizagem aconteça de forma significativa e dinâmica, o professor tem como apoio a técnica dos jogos.
São muitos os estudiosos do assunto, e para este trabalho foram consultados autores que relatam a importância do lúdico e do uso dos jogos em atividades didáticas para fundamentar ainda mais os pontos principais e melhor afirmar o que foi explanado, são eles: Airton Negrine, Celso Antunes, Gilda Rizzo e Helena Nylse Cunha.
A educação tem por objetivo principal formar cidadãos críticos e criativos com condições aptas para inventar e ser capazes de construir cada vez mais novos conhecimentos. O processo de Ensino/Aprendizagem está constantemente aprimorando seus métodos de ensino para a melhoria da educação. O lúdico é um desses métodos que está sendo trabalhado na prática pedagógica, contribuindo para o aprendizado do alunado possibilitando ao educador o preparo de aulas dinâmicas fazendo com que o aluno interaja mais em sala de aula, pois cresce a vontade de aprender, seu interesse ao conteúdo aumenta e dessa maneira ele realmente aprende o que foi proposto a ser ensinado, estimulando-o a ser pensador, questionador e não um repetidor de informações.
È preciso ressaltar que o termo lúdico etimologicamente é derivado do Latim “ludus” que significa jogo, divertir-se e que se refere à função de brincar de forma livre e individual, de jogar utilizando regras referindo-se a uma conduta social, da recreação, sendo ainda maior a sua abrangência. Assim, pode-se dizer que o lúdico é como se fosse uma parte inerente do ser humano, utilizado como recurso pedagógico em várias áreas de estudo oportunizando a aprendizagem do indivíduo. Dessa forma, percebem-se as diversas razões que levam os educadores a trabalharem no âmbito escolar as atividades lúdicas.
Como vemos Gilda Rizzo (2001) diz o seguinte sobre o lúdico:
“… A atividade lúdica pode ser, portanto, um eficiente recurso aliado do educador, interessado no desenvolvimento da inteligência de seus alunos, quando mobiliza sua ação intelectual.” (p.40).
Diante de tal pensamento que a estudiosa coloca, observa-se que o principal papel do educador é estimular o alunado à construção de novos conhecimentos e através das atividades lúdicas o aluno acaba sendo desafiado a produzir e oferecer soluções às situações-problemas impostas pelo educador. Pois o lúdico é um dos motivadores na percepção e na construção de esquemas de raciocínio, além de ser uma forma de aprendizagem diferenciada e significativa.
Convém ressaltar que o educador deve ter cuidado ao desenvolver uma atividade trabalhando o lúdico, por ser uma tarefa dinâmica, o professor fica na condição de estimulador, condutor e avaliador da feitura da atividade, no entanto o educador é o elo entre o lúdico e os alunos.
Da mesma forma deve ater-se na quantidade de atividades lúdicas, pois utilizada exageradamente acabam tornando-se rotineira e transformando-se numa aula tradicional.
Nylse Cunha (1994) acredita que a ludicidade oferece uma “situação de aprendizagem delicada”, ou seja, que o professor precisa nutrir o interesse do aluno, sendo capaz de respeitar o grau de desenvolvimento das múltiplas inteligências do mesmo, do contrário a atividade lúdica perde completamente sua riqueza e seu valor, além do mais o professor deve gostar de trabalhar esse novo método sendo motivador a fazer com que os alunos gostem de aprender, pois se o educador não se entusiasmar pelo que ensina o aluno não terá o interesse em aprender.
Celso Antunes (2001) argumenta da seguinte forma: “Um professor que adora o que faz, que se empolga com o que ensina, que se mostra sedutor em relação aos saberes de sua disciplina, que apresenta seu tema sempre em situações de desafios, estimulantes, intrigantes, sempre possui chances maiores de obter reciprocidade do que quem a desenvolve com inevitável tédio da vida, da profissão, das relações humanas, da turma…”(p.55).
A atividade lúdica mais trabalhada atualmente nas escolas pelos professores é o jogo, principalmente nas salas de aula do ensino fundamental por ter sua clientela na maioria das vezes formada por crianças. Sendo importante dizer que a palavra “jogo” foi utilizada para se referir ao “brincar”, se tratando de forma lúdica, levando em conta que o indivíduo não apenas se diverte jogando, mas também aprende.
A palavra “jogo” etimologicamente origina-se do latim “iocus”, que significa brincadeira, divertimento. Em alguns dicionários da Língua Portuguesa aparece com definição de “passatempo, atividade mental determinada por regras que definem ganhadores e perdedores”.
Numa de suas palestras Airton Negrine (1997) cita o seguinte:
“… a palavra “jogo” apresenta significados distintos uma vez que pode ser entendida desde os movimentos que a criança realiza nos primeiros anos de vida agitando os objetos que estão ao seu alcance, até as atividades mais ou menos complexas…” (p.44).
Pode-se dizer então que a palavra “jogo” apresenta significados variados, desde uma brincadeira de criança com fins restritos em diversão até as atividades mais complexas com intuito de adquirir novos conhecimentos.
Gilda Rizzo (2001) diz que “os jogos, pelas suas qualidades intrísecas de desafio à ação voluntária e consciente, devem estar, obrigatoriamente, incluídos entre as inúmeras opções de trabalho escolar.”
Pois o objetivo principal do jogo como atividade lúdica é proporcionar ao indivíduo que está jogando, conhecimento de maneira gratificante, espontânea e criativa não deixando de ser significativa independente de quem o joga, deixando de lado os sistemas educacionais extremamente rígidos.
Trabalhar com os jogos na sala de aula possibilita diversos objetivos, dentre eles, foram pontuados os seguintes:
  • Desenvolver a criatividade, a sociabilidade e as inteligências múltiplas;
  • Dar oportunidade para que aprenda a jogar e a participar ativamente;
  • Enriquecer o relacionamento entre os alunos;
  • Reforçar os conteúdos já aprendidos;
  • Adquirir novas habilidades;
  • Aprender a lidar com os resultados independentemente do resultado;
  • Aceitar regras;
  • Respeitar essas regras;
  • Fazer suas próprias descobertas por meio do brincar;
  • Desenvolver e enriquecer sua personalidade tornando-o mais participativo e espontâneo perante os colegas de classe;
  • Aumentar a interação e integração entre os participantes;
  • Lidar com frustrações se portando de forma sensata;
  • Proporcionar a autoconfiança e a concentração.
Nota-se também um entusiasmo maior sobre o conteúdo que está sendo trabalhado por haver uma motivação dos educandos em expressar-se livremente, de agir e interagir em sala de aula. Mas lembrando sempre que os jogos devem está devidamente associado aos conteúdos e aos objetivos dentro da aprendizagem, auxiliando a parte teórica, tornando o ensino mais prazeroso apresentando opiniões para crescer ainda mais o trabalho dos profissionais da área da educação.
Diante de tal objetivo, os jogos escolhidos pelos educadores para trabalhar precisam ser estudados intimamente e analisados rigorosamente para serem de fato eficientes, porque os jogos que não são testados e pesquisados não terão seu exato valor, tornado-se ineficazes, obviamente, uma atividade lúdica nunca deve ser aplicada sem que tenha um benefício educativo. O professor pode criar seus próprios jogos, a partir dos materiais disponíveis na instituição de ensino em que leciona ou até mesmo na sala de aula, porém precisa atentar para a forma de como serão trabalhados, não esquecendo os objetivos e o conteúdo a ser desenvolvido. O educador precisa ter muito mais força de vontade, criatividade, disponibilidade, seriedade, competência que dinheiro para construir um jogo.
Celso Antunes (2003) cita o seguinte sobre o jogo:
“O jogo é o mais eficiente meio estimulador das inteligências, permitindo que o indivíduo realize tudo que deseja. Quando joga, passa a viver quem quer ser, organiza o que quer organizar, e decide sem limitações. Pode ser grande, livre, e na aceitação das regras pode ter seus impulsos controlados. Brincando dentro de seu espaço, envolve-se com a fantasia, estabelecendo um gancho entre o inconsciente e o real”.
De acordo com Celso Antunes, pode-se afirmar que a ludicidade do jogo proporciona momentos mágicos e únicos na vida de um indivíduo, pois no mesmo instante que diverte, ensina e desenvolve o raciocínio e a criatividade além de obter responsabilidade diante da situação colocada a ele.
Diante de tudo que fora mencionado, pode-se dizer sem sombra de dúvida que o lúdico é importante sim para uma melhoria na educação e no andamento das aulas, provocando uma aprendizagem significativa que ocorre gradativamente e inconscientemente de forma natural, tornando-se um grande aliado aos professores na caminhada para bons resultados.
E que é dever do professor mudar os padrões de conduta em relação aos alunos, deixando de lado os métodos e técnicas tradicionais acreditando que o lúdico é eficaz como estratégia do desenvolvimento na sala de aula.
Espera-se que esta proposta de abordagem vá de encontro com o que foi proposto realizar, e essencialmente, que seja de suporte para professores que já atuam no ambiente escolar, e aos futuros profe ssores a tornar suas aulas mais dinâmicas fazendo com que a sala de aula se transforme num lugar prazeroso, construindo a integração entre todos que a frequentam.
Escrito por: Monalisa Lisboa - Retirado do Brinquedoteca

PEC 241 : COMO ELA IMPACTA A EDUCAÇÃO

13:58
PEC 241: como ela impacta a Educação
PEC 241: como ela impacta a Educação
A sigla PEC 241 está em alta nas últimas semanas. Para além dos noticiários de economia e política, o assunto deu as caras nas publicações sobre saúde e Educação, apareceu com força na linha do tempo das redes sociais dos brasileiros e entrou no papo dos estudantes secundaristas, que voltaram a ocupar escolas no país contra a medida.

Mas o que é, afinal, a PEC 241? A sigla é a abreviação de Proposta de Emenda Constitucional número 241, enviada ao Congresso Nacional no dia 16 de junho de 2016. O texto propõe a criação de um teto (limite máximo) para os gastos com despesas primárias dos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo a partir de 2017, pelos próximos 20 anos. A ideia é que o valor gasto seja limitado à despesa realizada na área no ano anterior, reajustada com base na variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA). A lógica só poderá ser alterada no 10º ano de vigência, por mandato presidencial. Os órgãos e poderes que ultrapassarem o teto de gastos sofrerão sanções, como a impossibilidade de realizar concursos públicos e reajustar o salário de servidores públicos. Na madrugada do dia 26 de outubro, essa proposta foi aprovada em segundo turno na Câmara dos Deputados, com placar folgado de 359 votos a favor, 166 contra e 2 abstenções. Agora, o texto segue para análise e votação no Senado.
O novo regime fiscal é uma das principais bandeiras do presidente Michel Temer. Segundo o governo, a aprovação da proposta é crucial para frear o aumento de gastos do país e diminuir a dívida pública. Para Henrique Meirelles, o atual ministro da Fazenda, o desequilíbrio das contas do país se deve especialmente às despesas definidas pela Constituição. Por isso, então, que foi feita uma proposta de emenda à Constituição com o objetivo de desvincular os gastos das receitas da União, como previsto pela carta magna.
E este é o ponto que mais pode afetar a Educação. Com a aprovação da PEC, a área, que tem repasse mínimo garantido por lei (piso) de 18% dos impostos da União, passaria a ter os investimentos estabelecidos com base na inflação. A diferença da Educação para as outras áreas é que o primeiro ano de vigência da regra seria 2018, e não 2017. Então, a partir de 2018, a União passaria a ter um investimento mínimo na área equivalente ao piso constitucional de 2017 mais a correção do IPCA. Ficam excluídos dos limites estabelecidos pela proposta o Salário-Educação e os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb).

Se a PEC for aprovada, o que pode acontecer?

O texto da PEC 241 não fala sobre estabelecer um teto para os gastos com a Educação. Ao contrário das outras áreas, que passariam a ter um limite máximo de gastos corrigido pela inflação, a Educação, assim como a saúde, ganharia um novo piso a cada ano. Além disso, quando os governos dos próximos 20 anos quiserem investir mais na área, será possível, pois não haverá sanções por ultrapassar o limite da inflação. Mas, para isso, será preciso equilibrar a balança, tirando de uma área para colocar em outra. A crítica é que, apesar de o texto falar em piso para Educação, fica estabelecido um teto global para os gastos, uma vez que é muito difícil que sejam redirecionados para a área recursos de outras pastas, como a Previdência, que já está onerada. No box no final deste texto, leia o posicionamento de especialistas e instituições sobre o assunto.
Em agosto de 2016, a Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira da Câmara dos Deputados realizou um estudo sobre os efeitos da PEC 241 na Educação. A análise mostrou que, caso a proposta valesse desde 2011, os valores recebidos pela área teriam sido menores do que realmente foram todos os anos, e não teriam atingido os 18% constitucionais (veja a tabela abaixo). Isso porque, nesse período, a arrecadação de impostos foi maior do que a inflação.
PEC 241: como ela impacta a Educação
Marcos Rogério Rocha Mendlovitz, responsável pelo estudo, explica, no texto, que 2016 é uma exceção, pois a inflação está alta e a arrecadação em queda. O cenário deste ano, sem perda de recursos, se repetiria em 2017, quando ainda se prevê uma inflação alta. No entanto, se aprovada, a PEC só passará a valer em 2018, quando projeta-se que arrecadação já deve voltar a crescer. “A partir de 2018, já começaria a haver perda, a qual se acentuaria rapidamente nos exercícios seguintes" (veja tabela abaixo).
PEC 241: como ela impacta a Educação
O governo, no entanto, tem defendido que a PEC protegerá a Educação e que, nos próximos anos em que a regra valer, o orçamento da não sofrerá perda. “Quando a arrecadação é baixíssima e a inflação é alta, como tem ocorrido, é normal que uma medida como essa pareça positiva. Mas, quando a arrecadação voltar a crescer e a inflação tender a se estagnar, o cenário será desvantajoso para a Educação”, explica Daniel Cara, coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação. Ou seja, os investimentos em Educação previstos pela PEC podem ser maiores que os atuais em momentos de crise, quando a inflação é alta e o crescimento da economia é baixo. Mas, caso o país esteja crescendo, a vinculação das despesas com a Educação às receitas significa mais dinheiro para a área.

O Plano Nacional da Educação (PNE) será cumprido?

A maior parte dos educadores e especialistas que criticam a PEC temem que, com a aprovação do texto, o cumprimento do PNE, que já teve o prazo de várias metas estourado, fique inviabilizado. Isso porque parte das metas, como a universalização da Educação Infantil, a valorização do professor e a ampliação da oferta de Educação integral dependem do apoio financeiro e de infraestrutura da União.
Ainda restam muitas dúvidas sobre o assunto. Entre elas, se a Educação continuará como uma prioridade daqui para frente, se o orçamento vai diminuir e quanto vai diminuir e se a PEC é, de fato, o melhor jeito de reequilibrar as contas públicas (outra possibilidade, seria, por exemplo, reformar a estrutura tributária do país).

O que especialistas e instituições de Educação estão falando sobre o assunto

"Em um momento de crise econômica, a solução não é reduzir os investimentos em Educação. Temos que criar caminhos que apontem não só para mais recursos mas também direcionem a gestão dos já existentes, para alcançarmos melhores resultados.
Ao invés de desvincular recursos, por que não exigir o cumprimento das metas estabelecidas no PNE, levando-se em conta as condições dos Estados e municípios? Não se trata de diminuir os repasses, e sim de mudar a sua sistemática, exigindo que as redes de ensino prestem contas e se comprometam com os encaminhamentos das metas.”

Maria Alice Setubal, presidente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), em artigo publicado no jornal Folha de São Paulo

"Somos favoráveis à adoção de medidas de reequilíbrio da economia e das contas públicas, que levem o País à retomada do crescimento e dos empregos. Entretanto, isso pode ser feito por outra via que não a asfixia dos recursos da área social. O que o País aplica em saúde, Educação e assistência social não é gasto, mas investimento. É investimento com as mais altas taxas de retorno. Os economistas sabem desse fato comprovado."

Ação em Defesa dos Direitos Sociais, criada por instituições como União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Instituo Alana e Instituto Avisa Lá

"O PNE possui 20 metas e dezenas de estratégias que objetivam a melhora da qualidade da Educação do País. Para conseguir alcançá-las, o Brasil precisará gerir melhor o seu orçamento, bem como aumentar o que já é investido. Estabelecer um teto para a área para os próximos 20 anos significa ignorar a situação atual do ensino e se conformar com um futuro sem avanços."
Todos pela Educação, em artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo

“É fundamental que a sociedade se oponha à PEC 241 e convença cada deputado e cada senador a votar contra a PEC 241. Parece que estamos falando só do nosso presente ou só do Plano Nacional de Educação que se encerra em 2024 mas, na realidade, estamos falando de um período de 20 anos de vigência dessa proposta de diminuição do investimento em Educação, saúde, e assistência social. E vamos viver 20 anos de finalização da possibilidade de o país ser de fato próspero e digno para sua população.”

Campanha Nacional pelo Direito à Educação, em vídeo feito pelo coordenador geral, Daniel Cara

Postagem retirada do SITE: NOVAESCOLA
Escrito por: Raissa Pascoal

ESTAMOS CRIANDO UMA GERAÇÃO DE ALIENADOS AFIRMA DR. CRISTIANO NABUCO

13:54

“Meu filho já sabe mexer no Ipad! É tão bonitinho!”
Esse tipo de conversa, ouvida em várias rodinhas de mães e pais, deveria chocar em vez de ser comemorada, segundo Dr. Cristiano Nabuco, Psicólogo e Coordenador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria da HC, Hospital das Clínicas de São Paulo. Ele conta ao blog com preocupação o que tem visto nos consultórios. Crianças viciadas em smartphones, videogames e tablets, incapazes de se relacionar (sem ser virtualmente), de se concentrar ou prosseguir com um raciocínio lógico.  “Estamos criando uma geração de alienados”, garante.
“Dia desses chegou uma senhora no consultório dizendo que o filho não saía mais do celular. Fiquei pensando quantos anos tinha esse menino, 8 anos, 9 anos? Ela contava que quando ele acorda, quer o celular, não almoça se não tiver o celular ao lado, não vai pra cama sem o aparelho. ‘Mas qual idade têm seu filho?’, perguntei. E ela me contou que o menino tinha apenas 2 anos e 4 meses.
Tive um paciente muito jovem que ficava conectado ao videogame 55 horas ininterruptas. Não levantava para almoçar, não levantava para jantar, nada. Ele era um zumbi, urinava na calça. Antes de a gente perguntar se a tecnologia é boa ou ruim ou a gente tem que perguntar onde está esse pai e essa mãe que permitem que o filho fique mais de 50 horas no videogame?
Eu gosto de contar essas histórias para mostrar que não tem nada de engraçadinho em facilitar o acesso a esse tipo de dispositivo para uma criança que não tem nenhum tipo de julgamento. Existe uma frase do livro do Conde Drácula que fala que ‘o mal é uma porta que se abre por dentro’. O mal que a tecnologia causa também é uma porta que se abre pelo lado de dentro. Podemos e devemos dar o acesso à tecnologia em certos momentos. Mas esse acesso deve ser controlado e, mais do que isso, não podemos esquecer que os mais novos imitam o comportamento dos mais velhos. Não adianta eu restringir o acesso se eu for o primeiro a levar o telefone para mesa ou para cama. Eu, como pai, mãe ou cuidador também tenho que estar apto de abrir mão de uso para servir de exemplo.”
Dr. Cristiano Nabuco, coordenador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas
Blog: Como a tecnologia pode causar dependência nos mais jovens?
Dr. Cristiano Nabuco: Alguns estudos já mostram que o celular, da forma que vem sendo utilizado hoje, vem criando o que chamamos de dependência tecnológica. Há pessoas que cada vez mais precisam ficar em contato com o celular, semelhante àquelas pessoas que são viciadas em álcool e drogas. Quando ficam longe apresentam reações de falta e de necessidade. Alguns estudiosos já dizem que a tecnologia é o novo vício do século 21. Assim como existe a dependência química, existe também a dependência comportamental. E no uso patológico da internet e do celular, muito embora não exista a ingestão de uma substância externa, os efeitos e dependência observados são muito semelhantes.
Blog: Por que o acesso à tecnologia tem que ser evitado em crianças pequenas?
Dr. Cristiano Nabuco:  Nosso cérebro sofre um processo de amadurecimento que só é finalizado após a maioridade, aos 21 anos. A região do córtex pré-frontal é a última área a ser finalizada, e o córtex é responsável pelo nosso raciocínio lógico e também pelo controle dos impulsos, é nosso freio comportamental. Eu sou adulto e sei, pela minha experiência, que não posso misturar caipirinha e vinho, sei que não dá para misturar bebida fermentada e destilada, eu consigo frear minha ação. No caso dos jovens, embora eles tenham acesso ao conhecimento, não conseguem diminuir o apelo do comportamento.  Por isso essas questões ligadas ao impulso são muito importantes, as pessoas têm de ficar atentas para que a vulnerabilidade cognitiva do cérebro não crie problemas de adicção.
Blog: A partir de que idade você pode dar um smartphone para uma criança?
Dr. Cristiano Nabuco: Nós estamos vivendo hoje um grande paradoxo. Se tem a noção de que quanto mais eu puder estar exposto a um determinado tipo de elemento ou circunstância, mais ele me beneficia. Por exemplo, quanto mais exercício físico eu fizer melhor, quanto mais estudo eu tiver, melhor, quanto mais contato com a tecnologia tiver, melhor. E é o contrário. A gente sabe que o nosso cérebro tem uma capacidade de absorção e depois de um certo tempo esse excesso começa a se tornar stress e provocar a reação contrária. O que a gente observa é que muitos pais, de forma inadvertida, acabam dando o celular para as crianças porque isso é um motivo de glamour, ‘olha só, meu filho já sabe mexer no celular!’ O que a gente recomenda é que nunca, nunca, jamais a gente deveria permitir o contato de uma criança com qualquer tipo de tecnologia antes dos 2 ou 3 anos de idade. Porque existem operações mentais que precisam naturalmente serem feitas e o grau de estimulação de um tablet desrespeita essa ‘ecologia’, essa natureza de desencadeamento da lógica. Já se sabe, por exemplo, que quanto mais você utilizar a tecnologia, piores serão suas funções cognitivas como a memória e desenvolvimento da atenção. Não é que sejamos contrários à tecnologia, não é isso, mas o alerta é que se tenha o mínimo de cuidado para que essa exposição seja zelada e observada.
Blog: Quais são as consequências dessa exposição cada vez mais precoce e intensa?
Dr. Cristiano Nabuco: Grande parte das informações que nos chegam pelos smartphones são absolutamente irrelevantes. Essa alternância de operação mental de ler um livro e parar para ver o celular, ouvir o professor e checar o celular, debruçar sobre um trabalho e voltar para o celular, começa a criar um padrão onde progressivamente o cérebro vai perdendo a capacidade de se aprofundar. A ponto de hoje, muitas vezes, quando nós vamos dar aula para os jovens na universidade e na graduação, eles não conseguem mais se debruçar e se aprofundar sobre textos mais densos. Eles perderam a capacidade de concentração. O manuseio contínuo das redes sociais, das buscas, da música e da fotografia, à ‘caça’ ao Pokemon, tudo isso cria uma poluição que compromete profundamente da lógica e a capacidade de raciocínio.
Garota Ipad
Blog: Qual o papel que a tecnologia deveria ter na vida dos jovens?
Dr: Cristiano Nabuco: Você pode usar a tecnologia. Ela tem de estar ao seu serviço e não ao contrário, ela não pode te deixar dependente e aprisionado. O que eu vejo é uma grande quantidade de jovens e adultos que vão dormir com o celular, que deixam o celular ao lado da cama, aquele celular fica apitando a noite toda, recebendo mensagens, ou seja, o sono, que deveria ser reparador, não cumpre sua função porque foi interrompido por inutilidades. Aí começa o ‘efeito cascata’. O que alguns pesquisadores têm dito é que a tecnologia, do jeito que ela tem sido utilizada hoje, de forma inadvertida, está causando uma grande limitação social. Parece que a tecnologia, hoje, deixou de ser uma ferramenta para se tornar um ruído e, no fundo, nossa qualidade de vida não está melhor, ao contrário, está pior. Estamos criando uma geração de alienados.
A gente sabe que 75% das famílias, cada vez que assistem a um programa de televisão, estão com o telefone na mão, olhando para a outra tela. Então aquilo que deveria acontecer – você com seu filho, fazendo comentários críticos ‘olha esse programa, que interessante ou não’,  ‘concordo com essa notícia ou não’ – aquele momento de criar uma consciência crítica na mesa, na hora do almoço ou do jantar, momentos tão raros devido à falta de tempo de cada um, são perdidos porque você está com seu telefone, mandando mensagem. Eu diria que chegamos a um ponto onde o convívio nosso com a tecnologia se tornou tão absurdo que aquilo que era atípico, virou normal. Esse maior acesso à informação, infelizmente, não está virando conhecimento. Nós perdemos valores e  teremos que reaprendê-los dentro dessa era tecnológica.
Nós somos testemunhas oculares de uma mudança nunca antes vista na história da humanidade. Essa revolução midiática está impactando tanto, que alguns antropólogos chegam a compará-la à descoberta do fogo. Como eu trabalho na área da saúde e a mim chegam cotidianamente os casos mais graves, eu tendo a ser mais reticente em relação à essas mudanças, que obviamente são positivas. No fundo a questão não é tecnologia e sim a vulnerabilidade de cada indivíduo, o jeito que as pessoas estão fazendo para incluir essa tecnologia em suas vidas. Tem uma escritora americana que eu gosto, a Sherry Turkle, que escreveu o livro  “Alone together”, e é dela uma frase que eu repito muito: “A tecnologia entra na vida de uma pessoa de uma forma negativa quando as relações pessoais não ocupam seu devido lugar”. Alguns pacientes verbalizam: “O celular é meu Prozac virtual, cada vez que eu me sinto mal eu vou para o smartphone e lá eu encontro tudo”. Isso explicaria porque um jovem ficaria 50 horas conectado, ou seja, na vida paralela, no mundo virtual, essas pessoas conseguem ser aquilo o que elas não são na vida real. É como se a vida virtual começasse a funcionar como um elemento compensatório.  Quem tem problemas de auto-estima, não consegue abordar uma pessoa porque tem vergonha, cria na internet e nas redes sociais o que a gente chama de ‘personalidade eletrônica’. Essas pessoas se tornam mais insubordinadas, mais corajosas, elas apreciam mais o que elas são. Obviamente que cada vez que eu vivo uma realidade com a qual eu me identifico mais, eu vou querer retomar a experiência. Os jovens  começam a não gostar mais da vida offline, a vida online começa a ser tão realizadora que se torna uma das bases do vício.
Fonte: http://vida-estilo.estadao.com.br/blogs/ser-mae/estamos-criando-uma-geracao-de-alienados-afirma-psicologo-do-hc/

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