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terça-feira, 16 de junho de 2015

A resposta mais simples é a de que não sabem escrever. Óbvio! Alguns escreveram apenas sete linhas, outros fugiram do tema, outros, ainda, certamente pensando que as redações não seriam lidas, copiaram outros textos. Mas todas essas questões têm origem que me parece muito clara: houve aumento de candidatos nas provas do Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), alguns oriundos de cursos que preparam mal os alunos, a começar pelo diagnóstico que a redação apresenta – os estudantes não sabem escrever. Verdade! Não sabem escrever porque não tiveram oportunidade de ler e pensar sobre o que leram. Este é um trabalho da escola: ensinar a ler e escrever.
Que práticas são desenvolvidas e não trazem resultados? Uma delas é corrigir sublinhando erros dos alunos e retirando pontos de suas notas em redação. Essa prática não corrige os erros e os alunos acabam por detestar fazer redações. Veja este caso: uma professora rigorosa corrigia todas as redações e, para cada erro, retirava meio ponto da nota. Joãozinho adorava escrever e fazia redações enormes, algumas com mais de duas páginas de caderno. Como escrevia muito, errava mais ainda. Certa feita, a professora escreveu um recado ao final do texto: “Se houvesse nota abaixo de zero, a sua seria menos quatro, mas, como não existe, ela é zero”. O aluno, que gostava de escrever e, ao mesmo tempo, era muito esperto, passou a fazer redações de quinze a vinte linhas. Obtinha notas entre seis e sete. Ao final do ano, passou sem estudos adicionais de redação, porém nunca aprendeu a escrever!
Outra prática é desvincular a leitura da escrita. Livros para leitura extensiva que não trazem para o aluno oportunidade de se expressar e mostrar que ampliou o vocabulário são livros assassinados no momento em que, ao serem indicados, é encaminhada também a data da “prova do livro”. Por essa razão, fazendo somente provas do livro, alguns alunos preferem o audiobook, excelente para quem já sabe escrever. Para os outros, não. Um chargista carioca elaborou um excelente diálogo entre dois colegas, em que um afirmava que não lera o livro de Machado de Assis porque usou o audiobook. Mais tarde, perguntou ao colega em sala de aula se traição era escrito com dois s ou xis. Ouviu, não expandiu vocabulário e não aprendeu a escrever.
Quando em colégios e cursinhos um professor acredita que a leitura não tem receptividade por seus alunos e faz um esquema para que eles consigam responder às questões de compreensão de texto, presta um desserviço à educação, por impedir que os estudantes visualizem as palavras. Se uma escola, em todas as disciplinas, não permite que os alunos pensem e discutam situações várias, seja em História, Geografia, Física ou Literatura, ela não atrapalha a compreensão de uma ou duas disciplinas, ela atravanca todo o aprendizado, que deve ter como base o princípio de que os educandos devem iniciar qualquer processo pelo ato de saber pensar. Quem não pensa só pode ser pensado por alguém, o que significa estupidez e alienação. Na prática dos textos, quem assim tentou aprender não sabe juntar as ideias nem organizar um texto.
Como a quantidade de candidatos do Enem aumentou, surgiram mais elementos que comprometem nosso ensino. Por isso, foi bom separar o resultado das redações do restante do corpo do exame. Alguns alegam que os estudantes não gostam de ler. Essa verdade é parcial. Os países anglo-saxônicos procuram usar livros editados pelos melhores escritores dos últimos cinquenta anos. Trata-se de uma estratégia de colocar os estudantes em contato com uma linguagem mais próxima. Quando usamos os clássicos de mais de cem anos de publicação, podemos desestimular a leitura.
Mas, mesmo assim, muitos não aceitam, alegando que, se não há leitura dos clássicos na escola básica, quando haveria essa oportunidade? Essa oportunidade surgirá quando o aluno aprender a ler. E não me refiro ao aprender a ler do letramento, à época dos 8 anos. Ali ele aprende a ler porque a partir dessa idade deve ler para aprender. Se nós não mudarmos as práticas de ensino, o aluno terá sempre dificuldade para compreender o que tiver de ler.
Oportunidades de leitura
O que ajuda, então, dentro da escola? Adotar um comportamento de leitura em todas as disciplinas, criando oportunidades para que haja momentos de demonstração da compreensão. Isso se faz por meio de debates. Ao se ler, refletir e debater, são criadas oportunidades de intervenção do professor, as quais levam os alunos a pensar sobre o que leram. Não há, portanto, disciplinas que requerem leitura e outras, não. Todas requerem leitura. Muitos erram questões em todas as disciplinas porque não sabem ler.
A escola, portanto, deve preocupar-se com a tarefa de estimular a leitura em todas as disciplinas, criar oportunidades de demonstração da compreensão dessas leituras e ter um objetivo: criar condições para pensar.
Nas redações, especificamente, preocupe-se o professor em fazer avaliações mais abrangentes. Criem três conceitos, que poderiam ser: bom, regular e fraco. O aluno nunca teria situação de perda. Ou ele nenhum ponto recebe em sua média bimestral se tiver desempenho fraco ou recebe algum percentual mediano, se for regular, e um percentual maior, previamente estabelecido, se tiver feito boas redações. Pratiquei isso em uma escola em que fui coordenador pedagógico por dezoito anos! Os alunos escreviam bem e não tinham rejeição às redações.
Na antiga Grécia, a palavra scolé, que deu origem à nossa “escola”, nunca significou o que nós entendemos por esse estabelecimento atual. A nossa palavra é uma onomatopeia, nada mais. Scolé, no grego antigo, significava o lugar do sonho e da criatividade. Foi isso que nós perdemos ao longo do tempo. Resta recuperarmos.

Artigo publicado na edição de março de 2015.

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