Frequentemente, após dar a palestra sobre o tema: Afinal, quem manda aqui?! Poder e liderança na sala de aula, recebo questionamentos e desabafos de professores sobre a dificuldade de se colocar limites na relação educativa, tanto no espaço da sala de aula quanto no contexto familiar, enquanto pais.
É certo que estamos lidando com uma geração mais questionadora, mais agitada, mais exigente e que perdeu um pouco os referenciais de respeito, mas também me parece verdade que estamos nós, pais e professores, com alguns problemas para desempenhar essa tarefa. Pelos depoimentos que obtenho ao conversar com pessoas que viveram outros tempos, no período compreendido entre as décadas de quarenta e setenta, pais e professores colocavam limites e não sofriam tanto por isso. Parece que alguns fatos, ao longo das três últimas décadas colaboraram para que nascesse em nós uma grande dificuldade no desempenho dessa função.
A primeira questão que me vem a mente é o mito do trauma, tão difundido na década de sessenta, apoiado pela “Psicologia do Sim” que condenava toda e qualquer forma de repressão. Trazemos reminiscências dessa Psicologia que nos cria uma certa dúvida sobre o fato de ser mesmo eficaz um “não” convicto, sonoro e tranqüilo numa circunstância em que se faz necessário. Ficamos na dúvida se a frustração realmente não traumatiza e se nossas crianças e jovens vão conseguir sobreviver a ela.
A mudança no papel da mulher na família também trouxe, a reboque, algumas dificuldades na colocação de limites. Quando a mãe vivia em casa e podia ser mãe em horário integral, o estabelecimento de limites se dava de forma natural, até porque esse era um dos quesitos para que ela fosse considerada uma boa mãe. O pai era o provedor, somente convocado a educar em situações extremas. A mãe era a educadora oficial. O mundo mudou e a mulher teve que encarar o mercado de trabalho. O convívio com os filhos foi reduzido, quando muito, à hora de acordar, na agitação de aprontar para a escola e à noite, diante do cansaço e do stress após um dia de trabalho. Essa nova rotina da mulher fez nascer uma mãe culpada, que carrega o sentimento de “abandonar a cria”. Como continuar estabelecendo limites com tranqüilidade e sem culpa?
Outro fenômeno, também ocorrido no seio da família foi sua reconfiguração em função do advento do divórcio. O aumento da freqüência de rompimentos de casamentos e de consequentes perdas de guarda dos filhos trouxe consigo o aumento da dificuldade de colocar limites. Institucionalizou-se aí o estilo paterno e o estilo materno de educar, que, em boa parte das vezes, não caminham juntos. A figura paterna, até então ausente do processo educativo, surge agora atônita, diante do papel de “educador quinzenal”, que nasce em meio à culpa da própria circunstância. É o tempo para ser pai, utilizado para conquistar e cativar o amor dos filhos. Como impor limites e conquistar o amor simultaneamente num tempo tão escasso? A figura materna foi mantida no posto. Continua com a mãe (que na grande maioria dos casos fica com a guarda dos filhos) a responsabilidade de educar já que convive mais tempo com as crianças.
As mães, por sua vez, com a separação, perdem a cumplicidade paterna (quando essa existia) e “perdem a mão” no estabelecimento de limites, ora exagerando, ora relaxando no rigor. Tanto a situação da mãe quanto a do pai são agravadas com um novo casamento, que passa a ser uma parceria conjugal, mas não se legitima como uma parceria educativa. Não são raros os conflitos no novo casamento que tenham como “pano de fundo” a não legitimidade do padrasto ou madrasta de colocar limites nos filhos do outro.
Diante de toda essa reconfiguração das relações educativas, surge um professor (não esqueçamos que o professor também está inserido em todo esse processo familiar) perdido diante da tarefa de colocar limites em um grupo de crianças ou adolescentes, que passou a chegar à escola sem os limites mínimos com os quais costumavam chegar em outros tempos. Com a árdua tarefa de ter que colocar limites de forma coletiva e individual, o professor transita entre a compreensão permissiva e a intransigência castradora, passando a considerar a tarefa de educar, o pior dos martírios.
Uma das principais conseqüências da reconfiguração das relações educativas é o fato de vivermos, hoje, numa sociedade com baixíssimo índice de maturidade emocional e com elevado índice de carência afetiva. Numa sociedade assim, passa a ser frequente o pavor de não ser amado e surge a dificuldade de se olhar a criança e o jovem com olhos de educador, ou seja, com os olhos de quem já superou todos os conflitos típicos dessas fases do desenvolvimento humano.
Aliado a tudo isso, a crise de valores que assola nosso mundo em transição nos impede de ter certeza quanto à atitude certa a tomar. Somos reféns da dúvida, da culpa e do sofrimento que ambas acarretam. Nossos filhos e alunos já perceberam isso e armam-se de “certezas circunstanciais” para atingir a nossa já frágil convicção de educar. “Você está sendo injusto!”; “Mas você dorme tarde sempre que quer!”; “Professora, você é a única que não deixa!”; “Pai, você bebe cerveja, porque eu não posso!?”.
Lançam ataques cruéis para a nossa geração de adultos portadores de uma consciência confusa e culpada que, muitas vezes nos aniquilam e nos impedem de dizer com carinho, tranqüilidade e firmeza um sonoro e necessário NÃO. E, na maioria das vezes, é isso que eles necessitam e até desejam, bem lá no fundo.
É certo que estamos lidando com uma geração mais questionadora, mais agitada, mais exigente e que perdeu um pouco os referenciais de respeito, mas também me parece verdade que estamos nós, pais e professores, com alguns problemas para desempenhar essa tarefa. Pelos depoimentos que obtenho ao conversar com pessoas que viveram outros tempos, no período compreendido entre as décadas de quarenta e setenta, pais e professores colocavam limites e não sofriam tanto por isso. Parece que alguns fatos, ao longo das três últimas décadas colaboraram para que nascesse em nós uma grande dificuldade no desempenho dessa função.
A primeira questão que me vem a mente é o mito do trauma, tão difundido na década de sessenta, apoiado pela “Psicologia do Sim” que condenava toda e qualquer forma de repressão. Trazemos reminiscências dessa Psicologia que nos cria uma certa dúvida sobre o fato de ser mesmo eficaz um “não” convicto, sonoro e tranqüilo numa circunstância em que se faz necessário. Ficamos na dúvida se a frustração realmente não traumatiza e se nossas crianças e jovens vão conseguir sobreviver a ela.
A mudança no papel da mulher na família também trouxe, a reboque, algumas dificuldades na colocação de limites. Quando a mãe vivia em casa e podia ser mãe em horário integral, o estabelecimento de limites se dava de forma natural, até porque esse era um dos quesitos para que ela fosse considerada uma boa mãe. O pai era o provedor, somente convocado a educar em situações extremas. A mãe era a educadora oficial. O mundo mudou e a mulher teve que encarar o mercado de trabalho. O convívio com os filhos foi reduzido, quando muito, à hora de acordar, na agitação de aprontar para a escola e à noite, diante do cansaço e do stress após um dia de trabalho. Essa nova rotina da mulher fez nascer uma mãe culpada, que carrega o sentimento de “abandonar a cria”. Como continuar estabelecendo limites com tranqüilidade e sem culpa?
Outro fenômeno, também ocorrido no seio da família foi sua reconfiguração em função do advento do divórcio. O aumento da freqüência de rompimentos de casamentos e de consequentes perdas de guarda dos filhos trouxe consigo o aumento da dificuldade de colocar limites. Institucionalizou-se aí o estilo paterno e o estilo materno de educar, que, em boa parte das vezes, não caminham juntos. A figura paterna, até então ausente do processo educativo, surge agora atônita, diante do papel de “educador quinzenal”, que nasce em meio à culpa da própria circunstância. É o tempo para ser pai, utilizado para conquistar e cativar o amor dos filhos. Como impor limites e conquistar o amor simultaneamente num tempo tão escasso? A figura materna foi mantida no posto. Continua com a mãe (que na grande maioria dos casos fica com a guarda dos filhos) a responsabilidade de educar já que convive mais tempo com as crianças.
As mães, por sua vez, com a separação, perdem a cumplicidade paterna (quando essa existia) e “perdem a mão” no estabelecimento de limites, ora exagerando, ora relaxando no rigor. Tanto a situação da mãe quanto a do pai são agravadas com um novo casamento, que passa a ser uma parceria conjugal, mas não se legitima como uma parceria educativa. Não são raros os conflitos no novo casamento que tenham como “pano de fundo” a não legitimidade do padrasto ou madrasta de colocar limites nos filhos do outro.
Diante de toda essa reconfiguração das relações educativas, surge um professor (não esqueçamos que o professor também está inserido em todo esse processo familiar) perdido diante da tarefa de colocar limites em um grupo de crianças ou adolescentes, que passou a chegar à escola sem os limites mínimos com os quais costumavam chegar em outros tempos. Com a árdua tarefa de ter que colocar limites de forma coletiva e individual, o professor transita entre a compreensão permissiva e a intransigência castradora, passando a considerar a tarefa de educar, o pior dos martírios.
Uma das principais conseqüências da reconfiguração das relações educativas é o fato de vivermos, hoje, numa sociedade com baixíssimo índice de maturidade emocional e com elevado índice de carência afetiva. Numa sociedade assim, passa a ser frequente o pavor de não ser amado e surge a dificuldade de se olhar a criança e o jovem com olhos de educador, ou seja, com os olhos de quem já superou todos os conflitos típicos dessas fases do desenvolvimento humano.
Aliado a tudo isso, a crise de valores que assola nosso mundo em transição nos impede de ter certeza quanto à atitude certa a tomar. Somos reféns da dúvida, da culpa e do sofrimento que ambas acarretam. Nossos filhos e alunos já perceberam isso e armam-se de “certezas circunstanciais” para atingir a nossa já frágil convicção de educar. “Você está sendo injusto!”; “Mas você dorme tarde sempre que quer!”; “Professora, você é a única que não deixa!”; “Pai, você bebe cerveja, porque eu não posso!?”.
Lançam ataques cruéis para a nossa geração de adultos portadores de uma consciência confusa e culpada que, muitas vezes nos aniquilam e nos impedem de dizer com carinho, tranqüilidade e firmeza um sonoro e necessário NÃO. E, na maioria das vezes, é isso que eles necessitam e até desejam, bem lá no fundo.
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